Elyvaris, O Bosque do Paraiso

Ao sudeste da Cordilheira Fulminante, além das neblinas da Floresta Sangrenta e a centenas de quilômetros de qualquer cicatriz de guerra, repousa Elyvaris — o Bosque do Paraíso.

Chamá-lo de “bosque” é um insulto de escala. E chamá-lo de “paraíso”… uma rendição da linguagem diante daquilo que não deveria existir.

Nada ali parece real. As cores são saturadas demais. O ar… leve demais. Os sons… harmônicos demais. Cada folha parece esculpida por mãos divinas. Cada raio de luz atravessa as copas como se o próprio sol seguisse uma coreografia invisível para tocar… mas jamais ferir.

Os ventos carregam perfumes impossíveis. Frutas que ninguém plantou, flores que nunca murcham e uma brisa constante… não quente… não fria… apenas perfeita.

A gravidade é gentil. As quedas são suaves. A dor… quase cerimonial, surgindo apenas para lembrar que ela existe… mas jamais para ferir de verdade.

A fauna… obedece a essa mesma ordem estranha. Veados de pelagem âmbar, aves de cantos irrepetíveis, borboletas que flutuam como fios de luz líquida.

Os rios… são mais que água. Refletem não o corpo… mas os pensamentos. Beber dessas fontes é mergulhar em sonhos tão vívidos que muitos, ao despertar, passam dias sem distinguir o real do ilusório.

As estações… não existem em Elyvaris. Primavera, verão, outono e inverno coexistem ao mesmo tempo, dobrando-se umas sobre as outras como páginas mal sobrepostas de um livro antigo.

O ciclo de vida e morte ali… segue um ritmo desconcertantemente belo. Folhas caem em espirais perfeitas. Frutas amadurecem e apodrecem em silêncio, com um perfume doce ao final. Predadores caçam… mas com precisão limpa, sem prolongar o sofrimento. Até o sangue… parece rubi líquido.

Quando a morte chega, ela é breve, silenciosa… sempre acompanhada de uma súbita explosão de cores e aromas. Os corpos são tomados pela terra em questão de horas, cobertos por musgos que florescem como véus de despedida.

Agricultura, caça e pesca existem… mas nunca além do necessário. Cada colheita, cada animal abatido, cada peixe retirado dos rios é motivo de celebração. Pequenas oferendas e orações são feitas a Thammur, o Guardião Adormecido sob o solo… e à sua Proxy, a voz desperta da vontade ancestral.

Os habitantes, poucos e dispersos, vivem em harmonia com o bosque, não como senhores… mas como hóspedes cautelosos. Moram em árvores ocas que se abrem ao anoitecer, usam ferramentas moldadas pelas próprias plantas, e jamais tomam mais do que precisam.

Não existem muros… nem fronteiras. Apenas trilhas que surgem quando o bosque permite… e desaparecem quando não são mais necessárias.

Druidas jovens descrevem Elyvaris como “uma miragem de esperança em um mundo que esqueceu o que é ser amado pelos deuses.” Mas os mais antigos… sabem. Sabem que nenhum equilíbrio é perfeito sem um preço oculto. Sabem que todo paraíso… é uma mentira bem contada.

No fundo de cada visitante… germina uma dúvida cruel: Se tudo é tão perfeito… então o que está sendo sacrificado para que essa perfeição permaneça?

Foi sob essas árvores que Edwyn Heiren, o maior dos mestres do Círculo da Terra, moldou seu saber. Ele não era apenas o guardião de Elyvaris… era sua extensão viva.

Mas até para Edwyn… o paraíso perdeu o sabor da descoberta. Quando todos os segredos lhe foram revelados, restou apenas o silêncio. E foi esse silêncio que o empurrou para um abismo mais profundo: o desejo de tocar o que jamais deveria ser tocado.

Quando chegaram rumores… sobre uma flor que brotava além do mar, nas margens apodrecidas de Xhaladrith… Edwyn partiu. Levou consigo encantamentos, algumas poções… e a convicção cega de que voltaria com um poder capaz de proteger Elyvaris até de Príncipes Infernais.

E de fato… algo voltou.

Uma figura com o nome de Edwyn… com os mesmos gestos, o mesmo sorriso… a mesma voz… Mas Elyvaris… que antes o abraçava… agora apenas o observa… em silêncio… como quem tenta decifrar uma mentira bem encenada.

Pois o verdadeiro Edwyn… nunca deixou Xhaladrith. Ele está lá… agora mais lama do que homem… mais guardião do que druida… mais maldição do que memória.

Enquanto isso… Elyvaris permanece. Intocado. Impossível. Como se o próprio abandono de Shevantia… ao menos aqui… tivesse sido esquecido.

Um paraíso que não pertence a este mundo… mas que, por alguma razão insondável… permanece… exatamente onde está.